quinta-feira, junho 01, 2006

Dias mais lentos...

6h00. Murmura ao ouvir o barulho irritante do despertador, aquela gralha eletrônica que não parava de gritar! Após alguns segundos se rende às obrigações do dia. Esfrega os olhos e lembra que ainda era terça-feira, mais três infinitos dias para o sagrado sábado. Deve levantar. Corre para o banho, quente, sempre. A fumaça ocupa o box, ela desenha e escreve seus versos prediletos... Ela tem mais cinco minutos e nem um segundo a mais.
Pega sua toalha vermelha, em contraste com o azulejo branco e se seca. Escolhe uma calça preta qualquer e a básica blusa branca. Toma seu café rapidamente e vai para o ponto de ônibus. Espera... espera... espera... mais 10 minutos ele deve passar, espera... Quando chega ela suspira, ônibus estava lotado. Aperta-se daqui, encolhe-se dali e no susto encontra-se imersa naquela caixa quadrada com mil e quinhentas pessoas ao seu lado. Uns cochicham dali outros reclamam acolá e ela escuta duas mulheres trocando receitas... Pensa: preciso parar de comer chocolate... aqueles doces após o almoço são um pecado! Olha para o lado e percebe dois rapazes falando sobre academia. Pensa: preciso entrar para academia, exterminar as gordurinhas que a cada dia “procriam” mais! No celular outro rapaz parecia conversar com a namorada, “Calma amor, tudo dará certo... A Júlia irá entender...” Quem seria Júlia, onde mora, o que faz, tantas pessoas no mundo que não conhece, sempre pensava nisso. Porém os problemas parecem se repetir, sempre... É a empregada que não foi, a reunião que não aconteceu, o chefe que é um babaca, a esposa que se preocupa com a lipo, casamentos em crise, a filha com dificuldade em matemática, a prestação do fogão que não foi paga, encontros e desencontros... Ahhh o mundo não muda, tudo sempre da mesma forma. E ela lá dentro da caixa grande cheia de pessoas ao seu redor... Seu ponto chegou. Deu o sinal. Aquele barulhinho que mesmo com o avanço da tecnologia continuava o mesmo. E no torce e retorce consegue depois de muito dizer “dá licença” desce quase que expulsa, repelida pela caixa grande e no impulso já atravessa a avenida. Mil carros da cor prata. Parece que atualmente todos são iguais, por onde anda a dissemelhança? Numa ocorrência jamais poderia colocar para diferenciar seu depoimento a frase “foi um carro prata”! Por onde andam os verdes, vermelhos, amarelos, rosas, roxos?? Todos cor prata. No muito preto. Chega em frente ao edifício, fila para entrar no elevador, mais um pouco e entra no elevador “décimo terceiro, por favor?” a ascensorista sorri e simpaticamente, faz o seu serviço árduo de apertar os ditados andares. Pronto chegou. Segue o corredor e avista a recepcionista, que há dias atrás lamentava não ter acertado na Mega Sena... Naquele dia estava radiante, animada discursava com a telefonista sobre sua vida perfeita, arranjara um namorado.

Passa pelas animadas meninas e diz "Bom dia! Mais um dia!", entra, toma seu lugar, liga o computador, espera uns segundinhos e digita sua senha. Sua carreira estava em plena ascensão. Uma mesa só pra ela, compromissos aprovados pela diretoria, promessas melhores. Suas várias horas de estudo e a conclusão da especialização foi o diferencial, conseguira aquela vaga disputada por muitos. Na tela sua agenda digital avisa sobre as visitas dos clientes importantes daquele dia. Revisão de orçamento... Certamente. Rotina... Ente um cliente e outro, um café, preto (tipo importação). Pouco tempo para o almoço, outro cliente, este bem vestido, terno preto, a gravata colorida demonstrava o estilo “moderninho”, maleta na mão, claro, não poderia faltar! Mais uma vez rever orçamentos... Valores aqui, redução ali já passava do meio dia. Acertados todos os detalhes uma breve paradinha para o almoço, corrido. Na volta, outro cliente, este a esperava na recepção. Mais algumas horas de trabalho, empresários importantes, cálculos gigantescos, números e negociações... Ela era muito boa nisso. A tarde não se arrastou, foi ligeira como nos tempos em que brincava com seus amigos no jardim de infância, só que agora com um pouquinho mais de responsabilidade... Mais 5 minutos para as 18 horas e ela ainda não terminara as tarefas do dia...necessário sair um pouco mais tarde. Antes de sair seu chefe tece elogios e sorri e a colega, recepcionista, certamente, naquele momento já estaria na lanchonete mais próxima acertando os detalhes para o próximo fim de semana. No escritório somente ela. A agenda ainda estava cheia, alguns telefonemas, cálculos básicos, contatos via e-mail e estaria livre... até o dia seguinte pelo menos. Mais um dia, nenhuma surpresa extraordinária mas, tudo dentro do que ela sempre planejara para a carreira. É... e pensar que o que ela realmente queria era um bom vinho tinto... um filme intenso... um abraço... um acalento... dias mais lentos... nada além disso. Algo simples e mágico como nas telas de cinema. E agora... Mais responsabilidade e menos tempo.

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